quarta-feira, 24 de março de 2010

Testamento.

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Te dou meus ossos. Pra você não ir embora, te dou desde o meu fêmur até os meus ossinhos frágeis das mãos que você gosta de desenhar com caneta Bic preta. Eu viro um monte de gelatina, se você quiser. Te dou os caquis que estão na minha geladeira, te dou minha cintura, te dou minhas estrias, te dou meu nariz estranho e te dou todos os meus cheiros, meus silêncios, meus monólogos mais incompreensíveis, minhas declarações de amor bêbadas, meu elogios desagradáveis, meus sustos, meus gritos, meus gemidos, meus xingamentos, minhas tremedeiras, minhas fomes, minhas dores de cabeça, meu cu, meus choros, minhas desconfianças, minha pele pra você tatuar o que quiser. Te dou meus pulmões e o meu fígado pra quando o seu finalmente desistir. Te dou minha bunda pra você guardar num canto do quarto e apertar quando sentir vontade, te dou o vinil do Raul que tá na minha parede, te dou minha máquina de escrever e meu notebook novinho, te dou todas as palavras que eu vou escrever daqui pra frente, todos os pensamentos que eu sequer ouso imaginar que um dia terei. Te dou tudo pra você ficar comigo até que viremos pó ou até que nos mandemos à merda. Meus peitos pequenos pra você botá-los inteiros na boca, meu útero pra você dar vida aos seus herdeiros, meus ouvidos pra você enfiar o dedo quando quiser irritar alguém. Te dou suas comidas favoritas, te dou todos os gatos que deixarem na rua, te dou meus neurônios, minhas plaquetas, minhas hemácias e todas essas merdas que a gente usa pra continuar vivendo. Te dou meu suor, minhas tintas, meus pincéis, os pelos do meu corpo, a cera que uso pra eliminá-los, minha saliva, cada centímetro das minhas unhas, todas as minhas felicidades, meus almoços, meus dentes, minha capacidade de mastigar, minhas olheiras, meu dinheiro, minha paciência, os cravos do meu nariz, minha casa, meus preconceitos, toda a água do planeta, meu coração que há 18 anos tem funcionado todos os dias, sem falhar. Te dou qualquer coisa que te faça me amar mesmo quando eu perder tudo o que me faz ser eu.

Mina Vieira.

7 comentários:

crap disse...

"Eu viro um monte de gelatina, se você quiser." me lembrou um episódio de family guy em que o peter deseja não ter ossos. eu tenho medo dessas minhas associações.

"Te dou os caquis que estão na minha geladeira"
porra... foda demais.
é dessas coisas simples que mais gosto nas coisas que leio nos teus textos.

Rodrigo disse...

Ah, desculpe, babe...
qlqr hora eu volto
talvez escreva algo pra vc

e ve se pára de falar dos seus peitos e da sua bunda.

Rodrigo disse...

Possivelmente era eu, sim.

Pára de falar, que fico com vontade de ver e tocar.

Alexia Bassi disse...

Amei! =D

Anônimo disse...

E no fim, tudo isso, para minha absoluta posse e deleite, depende apenas de que você me dê seu e-mail.

Anônimo disse...

meu, foda
foda demais!

Luciana disse...

adoro... vc manda muito bem! ;)
Quero estar na festa de lançamento do seu primeiro livro (se é que já não foi)
Beijos

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