Nietzsche aos 14.
Há oito meses, A. entrava quase que diariamente às 7h na escola em que ambos dávamos aula e me cumprimentava com um sedutor abraço matinal. Ocasionalmente, demorava mais que o usual esfregando sua barba macia na minha bochecha direita e terminava por deixar minha calcinha molhada. Às 7h, de olhos ainda inchados e tomada por um pequeno mau humor, eu me permitia sentir certa excitação apenas por notar o cheiro enjoativo de creme dental que saía da boca bem desenhada de A., professor jovenzinho e cheio de aspirações revolucionárias.
Além das aspirações revolucionárias e da barba macia, reunia em si várias outras qualidades capazes de levar suas alunas – que, consequentemente, também eram ensinadas por mim - a despejar em minha direção diversos comentários sobre ele. O cabelo era o tópico mais frequente nas rodas de conversa do intervalo ou mesmo nas fofocas irritantes de meio de aula que eu tão ferozmente tentava combater. As garotas se derretiam diante dos cachos desorganizados de A. e aparentemente tão macios quanto a sua barba. Suspiravam ao vê-lo passando as mãos cheias de giz despreocupadamente em seus cabelos enquanto apoiava-se no quadro negro e falava sobre marxismo com os olhos brilhando e um charme inacreditável. Logo em segundo lugar vinha a sua irremediável cara de canalha: com dentes meio separados enfeitando um sorriso encantador, ele era capaz de levar qualquer aluna à loucura com qualquer um de seus comentários, inocentes ou não. Pois eu sabia. Sabia de cada uma das tentativas pervertidas de levar alunas de quinze ou dezesseis anos pra casa, sabia de todas as vezes em que havia sido bem sucedido, sabia de dois ou três hímens que havia mandado pro espaço, sabia de umas garotas que choravam por ele no banheiro e de umas outras que me odiavam porque conversávamos nos corredores e nos abraçávamos sempre que possível.
Ele era desgraçadamente bonito, é preciso concordar. Quando estava frio, vestia camisas claras de mangas compridas e tecido leve que se assemelhavam a pijamas e exatamente nesses dias nossos abraços tornavam-se intermináveis pra escola toda parar e comentar maldosamente que os dois professores revolucionários e adorados pelos alunos talvez estivessem tendo um caso. Mas não estávamos. Eu passava as unhas nas suas costas por baixo da camisa e ele me apertava mais pra perto pra sentir meus seios contra o seu peitoral digno de várias horas de admiração. Às vezes, eu chegava a deixar escapar pequenos gemidinhos enquanto A. passava a barba no meu rosto e o via se afastar com um sorriso safado grudado na cara. O mesmo que usava com suas alunas, eu tinha certeza. E, por isso, eu era imune ao seu charme insuportável. Afinal, tinha mais de dezoito anos e não depositava grandes esperanças em homens que costumavam comer garotinhas virgens e inexperientes. Ele, provavelmente, era muito ruim de cama. E inseguro. E egoísta. E cheio de assuntos insuportáveis e erros de português.
Aqui, espero que já tenham deduzido que nunca havíamos nos encontrado fora da escola. Nunca trocamos telefones, nossos e-mails sempre foram dotados de um profissionalismo exemplar e nossas conversas se reduziam a amenidades nada calorosas ou pessoais. Mas eu me vestia pensando nele. À noite, quando geralmente preparava as aulas do dia seguinte, pensava incessantemente no que vestir. Sabia que ele adorava as minhas saias, minhas sandálias de couro, os vestidos que marcavam discretamente a minha bunda grande, meu rosto sem maquiagem, minhas orelhas sem brincos. E eu me esforçava pra arrancar dele seus elogios sutis e os olhares indiscretos que às vezes lançava a todas as direções do meu corpo. Sorríamos quando nos encontrávamos. Aliás, provocávamos encontros casuais como dois adolescentes idiotas e às vezes eu o pegava me olhando sem disfarçar, me encarando e umedecendo os lábios num convite claro ao duelo. Mas fui capaz de manter uma distância segura de A. até setembro, mês no qual o vi parado em minha frente sem camisa, suado e ofegante.
Era feriado e eu estava sozinha, como quase sempre estava. Cansada de ler deitada no sofá de casa, cheia de um calor que me fazia tomar um banho a cada trinta páginas, decidi exalar intelectualidade num parque que ficava a poucos quarteirões da minha casa. Tomei um último banho, prendi o cabelo e andei até lá. Não me olhei no espelho antes de sair de casa, não passei um hidratante diferente em cada membro do meu corpo e muito menos perdi segundos de leitura me perfumando exageradamente. Fui, apenas. Lá, busquei uma sombra e me sentei sobre o lençol branco que havia levado pra evitar que a grama despertasse coceiras incômodas e atrapalhasse minha concentração. Com uma água de coco na mão, retomei minha leitura e por uns vinte minutos não desgrudei o olhar das páginas. Mas então ele se sentou do meu lado sem pedir licença, sem me cumprimentar, sem me dar nenhum de seus abraços costumeiros e sorriu deliciosamente ao conferir o título do livro que agora jazia sobre as minhas pernas nuas e não bronzeadas. Thoreau,é? Eu sabia que ele estava impressionado. Thoreau, professor. Respondi debochando e já me inclinando pra mais perto.
Thoreau e você de tie-dye curtinho, sem sutiã, na esquina da minha casa.
O convite estava feito. Era um dia tedioso, restavam-me apenas poucas páginas do livro pra terminar, a casa dele era ali na esquina, a minha era um pouco mais pra frente e ele estava passando as mãos nos cabelos como fazia na sala de aula. Eu mordia os lábios, me sentindo uma das suas adolescentes e, de forma inexplicável, via prazer nisso. Olhei para o peito firme de A. sem esforço algum pra simular outro interesse. Seus pelos bem distribuídos, claros, adornando a pele branca e molhada me convenciam melhor que qualquer proposta inteligente. Mas ele fingiu que não havia me convidado pra nada e em poucos segundos estávamos lá, quase recompostos, falando do Thoreau dele, do meu Nietzsche, do meu Sartre, dos meus relacionamentos kunderianos que inconscientemente eu pedia pra que fossem os dele também. Nenhum erro de português, assuntos fascinantes, um cheiro bom vindo de todas as partes do seu corpo e minhas mãos subindo e descendo por aqueles pelos, às vezes perdendo-se entre duas coxas grandes que eu mal conseguia segurar. Ele olhou pros lados duas vezes, sem parar de falar comigo, segurou minha mão direita e me indicou onde seu pau estava. Eu parei de falar e abri a boca numa expressão de surpresa, susto e excitação. Com aquele pau latejando e aquele sorriso canalha sorrindo pra mim, eu fui pra casa dele.
Trepamos em sua cama, em seu quarto rodeado de livros. Ele era, com toda a certeza do mundo, o homem nu mais bonito que eu havia visto até então. Sua beleza bruta estava presente desde os seus pés brancos até seus ombros largos e bons de apertar. A. me apertava muito, também. Enquanto me beijava com uma língua nada moderada, apertava meus braços finos com força e às vezes parava de me beijar pra assistir minha reação. Eu sempre gemia mais forte diante dessas pequenas violências. Chupava-me com uma destreza inacreditável para a sua pouca idade e eu me contorcia gemendo o seu nome enquanto ele me batia, ainda meio tímido, e apertava a minha bunda com devoção.
Mina Vieira.
Inveja.
Antes, vamos às explicações: eu estava aqui tranquila, retomando um texto antigo cheio de sexo, cigarros, drogas, calcinhas sensuais, garotas possíveis e algum rock n roll (só o de sempre) e tentando terminá-lo, quando percebo que um pedaço dele que havia escrito um tempinho atrás simplesmente desapareceu. DESAPARECEU. Escrevi e não salvei, sei lá. Fiquei louca, obviamente. Enquanto me recuperava, fui lendo umas velharias e achei o texto abaixo, escrito num momento de inacreditável ternura e dúvida. É estranho, vou avisando. Nem sou eu. Achei que nunca publicaria e corro sérios riscos de perder uns dois leitores. Mas, toma!
Minha filha foi o primeiro bebê com o qual eu, de fato, tive contato. Não que antes dela eu não gostasse de crianças, mas eu nunca antes havia achado necessário estabelecer laços com alguém que não fala, não anda e que depende de mim completamente. Portanto, ela foi o primeiro bebê que eu segurei no colo por mais de 2 minutos. E eu não sabia como fazer aquilo. Parecia tudo desajeitado, ela parecia estar caindo o tempo todo e meu colo parecia - espero que só para mim - o lugar menos confortável do mundo. Era impossível fazer aquilo certo. Ainda no hospital eu tinha que me olhar no espelho segurando aquele embrulho pra ter certeza de que parecíamos plausíveis como mãe e filha. Ainda não sei se conseguíamos. Preciso confessar que eu queria muito que ela fosse um bebê normal, e não filha de um cabeludo mal humorado e uma menina de 18 anos que não sabe trançar o próprio cabelo. Então, enquanto me esforçava pra fazê-la parecer ordinária, um bebê qualquer, eu pude me dar conta do quão perfeita ela era. Seus poros eram impecavelmente fechados, ela tinha o olhar tranquilo de quem não conhece o mundo e uma ausência linda de marcas na pele. Eu, enquanto isso, sofria os efeitos do fim da minha adolescência, dos vinhos que eu havia bebido até ali, das doses de uísque, dos cigarros fumados, das noites inconsequentes, do sol tantas vezes ignorado e da carne de porco que comia quase diariamente. Mas tentei não invejá-la. Seria estranho invejar um bebê, talvez tão estranho quanto invejar uma equação matemática. Pensava não ser capaz de amá-la mais do que a mim mesma. Quando engravidei, o mundo ainda girava ao meu redor e eu me recusei por um longo tempo a deixar o picadeiro. Agora, tudo era Alice. Os elogios do pai, meu dinheiro, as músicas que ouvíamos, os presentes criativos de amigos meio artistas, todos dela. Continuei não sentindo inveja, mesmo sem entender. Em casa, longe de todos os olhares, pude aprender a lidar com aquilo. Eu, que sempre havia sido totalmente verbal, aprendi a observar. Ela apertava meus dedos e não soltava nunca mais. Chorava sempre, me pedia muitas coisas e não falava palavra alguma. Enquanto eu amamentava, me mordia com as suas gengivas nuas e me apertava sem sequer imaginar que aquilo doía. Ela me tomava muito tempo. Por quase um ano não tive tempo algum pra cuidar de mim. Minha pele deve ter ficado ainda mais mal tratada, ganhei peso, deixei de fazer as unhas toda semana, deixei de lavar os cabelos todos os dias, passei a ter cheiro de leite materno. Era inevitável. Era matematicamente impossível ser bonita e mãe ao mesmo tempo. Depois de uns anos as coisas foram melhorando, fui me acostumando com aquela nova condição e me adaptando ao novo estilo de vida. Um dia ela cresceu e completou sete anos de idade. Quando cheguei em casa, ela estava brincando com os chapéus do pai, se enrolando nos meus xales e usando uma miniatura de calça jeans. Ela é linda. Eu podia sentir inveja, agora, mas apenas caminho até ela e a aperto, interrompendo a brincadeira.
Mina Vieira.
Relato (ou Homem)
Moro em uma cidade que se pretende grande e descolada. Bares modernos, escuros e com ar condicionado potente, prédios altos, casais inusitados se beijando freneticamente pelas esquinas e cinco sorveterias a cada quarteirão. Na minha cidade que avança lentamente rumo ao caos mora Cíntia. E Cíntia é, com o perdão da hipérbole, a mulher mais fascinante que já conheci. Ela me amava, apesar de eu achar que jamais havia merecido. Com proporções perfeitas, eu deixava que ela ocupasse minha cama três vezes por semana, às vezes mais, e a contemplava com ternura e boa dose de desejo sempre que saía para trabalhar. Proporções perfeitas! Seios brancos de mamilos delicados que eu mordiscava em reverência e logo abaixo aquela barriga lisa de quem havia comido pouco quando criança, acabando num ventre largo que às vezes parecia exagerado diante de tanta miudeza: era o corpo de Cíntia estirado em minha cama. Mas era também impressionante quando acordada, é necessário dizer. Sua memória infalível me salvava constantemente de diversos possíveis problemas e a graça com que demonstrava conhecer cada centímetro sujo dos meus infinitos labirintos mentais não me incomodava nunca. Deixava que Cíntia falasse por mim, realizasse minhas vontades, me lembrasse das minhas convicções e cavalgasse destramente sobre mim sem que eu sequer ameaçasse interrompê-la. Assim, eu vivia feliz e confortável há três anos ao lado dos 1,74m de Cíntia.
Mas, claro, houve uma noite em que ela não estava aqui para me fazer acreditar em minhas próprias convicções. Um erro fatal. Eu estava em um dos muitos bares modernos, escuros e gelados que conheço e Cíntia estava lá longe irritando o mundo com o seu equilíbrio e a sua estranha compreensão de todas as coisas, linda e ocupada. Então, decidi ser homem.
Clarissa foi andando rumo ao banheiro e, mesmo quando já estava passos distante de mim, ainda era possível sentir o seu perfume. Para já me redimir, digo que era tão nauseante quanto a sua voz. E isso quer dizer muito. Então, ela voltou e me cumprimentou cheia de uma intimidade e um interesse que há tempos eu não presenciava partindo de um corpo feminino que não fosse o de Cíntia. Pensei nela, pensei na minha Cíntia lá longe enquanto meu pau endurecia impiedosamente por uma outra que nunca seria digna de uma das minhas ereções. Logo eu, eu que havia gastado grande parte da minha adolescência convencendo a mim mesmo e aos outros de que não me excitava com clarissas, agora estava ali, ridículo, tentando esconder meu tesão por uma mulher que reunia em seu corpo pouco gracioso uns tantos motivos pelos quais eu repudiava a humanidade.
Porém, Clarissa aproximava sua boca grande da minha orelha para vencer o barulho da banda ruim e me confundia com perguntas e comentários incoerentes – mas às vezes verdadeiros – sobre Cíntia, a minha. O intervalo entre meus goles se tornava cada vez menor, até que o ato engolir minha cerveja gelada se consolidou como constância. Às vezes, a voz esganiçada e falha de Clarissa parecia dizer algo interessante e às vezes eu passava a mão em seus cabelos e pensava nos cabelos de Cíntia que sempre dançavam hipnoticamente quando ao vento. Mas não havia a mulher que eu amava em Clarissa e talvez por isso quiséssemos nos beijar. Ali. Cercado de pessoas que sentiam verdadeiro carinho por minha vida conjugal, que a respeitavam e chegavam a invejá-la. Ali, beijei Clarissa com a boca que há três anos decidi entregar a outra mulher, escolhida espontaneamente num mar infinito de possibilidades. Traí, além de Cíntia, também minha própria escolha sem sequer ponderar, minha maior convicção, o Deus cujos pés eu beijava quase todas as noites antes de dormir. Como um animal, sugava Clarissa para que todos vissem, metia minha língua meio bêbada numa boca desconhecida e preciso confessar que gostava. Uma noite, tive um corpo que não o dEla em minhas mãos e fui feliz.
No dia seguinte, negava-me a falar com Cíntia não sei se por covardia ou medo ou arrependimento ou pena. Mas me doía pensar nela e me lembrar de como eu havia tido a coragem de começar a destruir o que nós, juntos e apaixonados, construímos com afinco. O dia arrastou-se como que por tortura e, a cada ruído menos usual que me surpreendia, tinha a certeza de ter sido descoberto. Ao mesmo tempo em que fugia dos telefonemas e me esquivava do encontro inevitável, desejava ouvi-la e perceber que tudo estava bem e que o amor prevaleceria e que em poucos meses estaríamos morando juntos, comendo a mesma comida e depositando dinheiro na mesma conta. Mas minha Cíntia era feroz e não foi possível evitá-la por muito tempo. Naquela mesma noite a tive subindo no meu colo, lambendo meu pescoço e gemendo meu nome com a cara metida no travesseiro. Eu a amava com toda a minha sinceridade e devoção, mas ainda me excitava quando pensava nos seios grandes de Clarissa pouco abaixo do meu peito.
Passou. Cíntia sofre as dores da minha inconsequência até hoje, eu sei. Nunca contei a ela e pretendo nunca contar, pois isso ofenderia a serenidade que tanto sofremos para atingir, mas ela me olha doída a cada menção à Clarissa e sei que me odeia durante os seus silêncios. Arranha minhas costas de leve, encarando o teto, enquanto se questiona sobre quando é que eu vou aprender a dizer a verdade e, principalmente, sobre os meus motivos. Às vezes comete a estupidez de se achar feia e indigna. Agora, se nega a ter filhos e diz que minha porra dentro dela a incomoda, mas continua engolindo. Não sei dizer até quando. Ela, brutal, me pune sutilmente e sem de fato querer me machucar. Pretendo perdoá-la quando decidir me morder até sangrar e rezo todos os dias – às vezes com medo de ser atendido – para que ela também se permita pecar e me traia e eu talvez finalmente comece a me sentir menos pesado. Amo Cíntia verdadeiramente.
Mina Vieira.
Czechvar.
Enquanto ia levantando da mesa pra ir ao banheiro, ele me disse que meu único defeito era não gostar de vodca. E ele tinha essa mania: quando ficava bêbado, despejava umas frases que pareciam não se encaixar na conversa que estávamos tendo no momento, ou em qualquer outra, de qualquer outro casal, em qualquer outro momento. Eu, normal que sou, demorava e só as comentava quando tinha certeza de tê-las entendido, coisa que nem sempre acontecia. Mas naquela terça-feira à noite, no boteco de sempre, depois de oito cervejas caras, eu quis saber qual era a dele com o meu asco à vodca, porque eu tinha essa mania de querer saber exatamente das intenções escondidas por detrás de cada uma de suas palavras. Acreditava que não existiam coisas ditas sem propósito e que, caso existissem, eu certamente as odiaria. Eu me esforçava por ser sempre minuciosa com o que falava, porque ele era imprevisível e louco, podendo reagir a um mesmo comentário com silêncios insustentáveis pelo resto da noite ou fugas repentinas. Portanto, eu exigia que ele tivesse o mesmo cuidado ao despejar seus rompantes de sinceridade rumo ao meu corpo magro dominado pelo mais delicioso lúpulo tcheco, porque eu era louca, russa e não gostava de vodca.
Fiquei arrumando o sutiã enquanto esperava a eternidade que ele demorava no banheiro. Ele talvez estivesse fumando lá fora sem me avisar, talvez tivesse se esquecido de mim aqui no balcão e parado pra conversar com algum belo exemplar do sexo feminino que depois ele juraria não ser atraente ou sequer ter existido. Outra mania. Éramos um casal tolerante, todos diziam, mas ninguém ousava comentar sobre as longas e sofridas escaladas rumo ao nosso equilíbrio invejável.
Quando nos conhecemos, meus quinze anos tentaram me manter metros e metros afastada do universo adulto dele: eu não bebia, comia biscoitos integrais, ouvia Yes e saía de casa uma vez por mês pra trepar com desconhecidos que tremiam diante da minha bunda bem torneada de adolescente e dos meus peitinhos brancos e minúsculos. Ele vivia enchendo a cara com amigos que há tempos haviam terminado a faculdade, fumava maconha, ia a shows do Ozzy Osbourne e trepava com desconhecidas de corpos bem distantes da perfeição pelo menos duas vezes por semana. Eu queria me casar com um idiota que me amasse incondicionalmente e que perdesse a virgindade comigo, que fizesse dinheiro honesto pra pagar a escola dos três filhos que teríamos e que me escrevesse cartas de amor no dia dos namorados depois de dez ou quinze anos de casamento. Ele vinha fugindo de relacionamentos promissores há mais de dois anos, depois de ver o último deles afundando graças a meses e meses de louça suja na pia e vinha tentando, desde então, destruir seu fígado, seus pulmões, seus neurônios e seu dinheiro até finalmente morrer.
Então, eu apareci pra ele e ele apareceu pra mim. Apesar de improvável, sabíamos cantar as mesmas músicas e ele gostou da minha bunda – sempre ela - e eu gostei do cabelo dele e por duas semanas não conseguimos parar de dividir nossas histórias. Ele me ouvia contar coisas sobre meus pais mortos e ria do sotaque russo que eu tentava forçar, sem sucesso. Dirigia horas e horas me ouvindo falar enquanto pensava em um lugar decente pra matar a fome que eu sempre tinha e sempre acabava tomado por algum mau humor que eu não entendia e que ele não fazia questão de explicar. Tentava tirar minhas roupas no cinema e eu, fingindo-me de ofendida, segurava suas mãos só pra depois soltar e deixar começar tudo de novo. Desde o início, notei que sua língua era mais hábil que o normal e quase recuei quando vi seu pau ereto pela primeira vez, em nosso terceiro encontro. Não havia visto muitos paus na vida e aquele era, sem dúvidas, impressionante, do tipo que deixa a gente sem saber direito por onde começar, mas que depois acaba se mostrando delicioso e anatomicamente ideal. Tive que chupá-lo. Apesar de termos concordado em passar um tempo naquele quarto de motel só porque estava calor e queríamos ar condicionado, eu não me permitia e nem estava conseguindo negar sexo por completo. Então, como por consolo, deixei que gozasse duas vezes na minha boca.
Mesmo com todo o entusiasmo e toda a nossa boa vontade, tivemos primeiras trepadas decepcionantes e nós dois sabíamos disso. Não conseguíamos nos mexer ao mesmo tempo, eu não gozava nunca e terminávamos todas as nossas tentativas frustrados e com raiva um do outro. Pensamos em desistir, pois ele estava velho e sem paciência pra me ensinar a beber e não nos dávamos bem na cama. Eu sabia que ele não era meu idiota e que não me amaria incondicionalmente, mas antes de fugirmos acabou acontecendo. Com o carro estacionado numa rua escura e estreita, mas que cortava uma grande avenida, ele me pediu, depois de uns beijos brutos e cheios de língua, que eu me sentasse em seu pau, de costas pra ele. Obedeci. Eu gemia alto e segurava firme com as duas mãos na direção. Ele me bateu. Uma, duas, três, quatro, cinco, seis, sete vezes. E então nos tornamos namorados.
Agora, sete anos depois, eu bebia diariamente e havíamos descoberto inúmeras semelhanças cinematográficas e ideológicas, a diferença assustadora entre nossas idades havia deixado de ser piada entre seus amigos e eles finalmente me levavam a sério. Ainda nos estapeávamos quando ele queria ouvir Neil Young a noite toda ou quando eu elogiava demais os meus quadrinhos favoritos e dizia que ele tinha que ler isso e tinha que ler aquilo, mas morávamos juntos, limpávamos a casa todos os domingos, vendíamos pão, fazíamos traduções exaustivas, trocávamos apelidos ridículos e bilhetes safados, engordávamos, tentávamos ter um filho e trepávamos maravilhosamente bem algumas vezes por semana. E ele sempre me enchia o saco com essa merda de vodca.
Nós dois passávamos todos os dias de nossas vidas alcoólatras nos dedicando às bebidas de maior qualidade. Poucos amigos aceitavam nossos convites pra sair, éramos uns chatos. Verdadeiramente apaixonados por cerveja, direcionávamos grande parte de nossa renda mensal a experimentá-las e discuti-las. Tínhamos uma paixão indestrutível por uma marca inglesa e por absolutamente todas as cervejas tchecas, que eram as mais bem lupuladas e que, na minha forma peculiar de descrever cervejas que ele entendia tão bem, exalavam cheiro de bosque lodoso quando abertas. Às vezes, porém, acabávamos cedendo e nos rendendo a outras bebidas: uísque quando estávamos prestes a trepar ou vendo filmes de faroeste na TV, vinho quando estávamos prestes a trepar e/ou quando estava frio, e ele me admirava – sem participar - enquanto eu apreciava, como homem feito, minhas doses de cachaça de quase todos os estados brasileiros que tomava quando queria ficar bêbada rapidamente. Mas não vodca. Nunca vodca. Odiávamos vodca. Eu, principalmente. Vomitei tudo o que havia dentro de mim quando tomei vodca pela primeira vez e ninguém me convenceria de que uma coisa que precisa ser misturada com outra pra ser bebida é uma boa idéia.
Então, ele veio. O desgraçado veio andando sorridente com um irritante copo de vodca na mão. Daqueles de uísque, largo, e com vodca até a metade. Era uma das manias dele atingindo níveis absurdos. Ele fazia isso com comida também. Insistia pra que eu comesse coisas que odiava desde a infância, ficava dizendo come come come come come come come come come até me deixar puta, mas eu não comia. Aí jogava a coisa que eu não queria comer bem no meio do meu prato e continuava com o come come come insuportável. Por último, pegava com o garfo e colocava bem perto da minha boca, me fazia rir e pronto, enfiava lá dentro. E como eu o odiava nesses momentos. Chegava a gritar de ódio, às vezes chorava e explicava pra ele que aquilo era de uma maldade sem tamanho, mas não adiantava. Na semana seguinte lá estava ele tentando me fazer comer seus vegetais estranhos ou suas combinações que tanto me assustavam.
Você é russa, ele disse batendo o copo na mesa e fazendo o líquido transparente saltar. Tem que aprender a tomar como o seu pai tomava, todos os dias antes das refeições, sem frescura. Meus olhos se encheram d’água e eu implorei mentalmente para que ele não fizesse aquilo, pra que se sentasse, pedisse mais uma Fuller e continuasse a ser o cara legal com o qual eu havia escolhido morar. Mas não, ele já estava segurando o copo e a minha mão ao mesmo tempo. Eu o odiava. E por que ele não tomava? Por que é que ele não se entregava ao maravilhoso mundo russo da vodca sem gelo? Eu havia nascido lá e botado o pé na Rússia apenas duas vezes quando ainda era criança, mas nunca mais, não nutria nenhuma simpatia por aquele lugar ou pelos meus familiares russos e estava pouco me fodendo pra tradição ou para o que meu pai morto fazia todos dias. E ele insistia. Bebe bebe bebe bebe bebe bebe tem que beber bebe bebe bebe. Trinta segundos de tortura absoluta.
Você é um merda, eu falei. Você é um merda covarde, bêbado e idiota. Peguei minha bolsa, as chaves do carro em cima da mesa e fui embora. Voltei pra casa com o carro dele e sentindo imensa dificuldade pra dirigir, pois ele nunca havia me deixado dirigir bêbada. Ele chegou em casa uns vinte minutos depois, de taxi. Me deu um beijo na boca, me mostrou três lindas garrafas verdes que logo depois colocou na geladeira e perguntou se podia me levar pra cama. Acabei deixando.
Mina Vieira.
Calcinha de algodão.
Obrigada.)
- Quando você começou a me amar? Ela perguntou.
- Foi quando você teve a sua primeira gripe forte e eu fiquei com medo de você morrer.
Depois, já cansados e sonolentos, ela me arrastou pra cama. Ficou quieta durante todo o caminho. Às vezes, eu soltava a minha mão da mão dela e acariciava sua cintura fininha, meio querendo fazer cócegas. Ela me olhava nos olhos e sorria bem rapidinho, depois voltava a olhar pro chão e inventava no rosto uma expressão que mentia, que me dizia que ela nunca havia sorrido. Mas chegamos ao quarto, finalmente. Quieta, com cara de ofendida, tirou a roupa como sempre fazia antes de dormir, desabotoou o sutiã branco, vestiu um par de meias cinzas e velhas que eu há tempos não usava, se cobriu com os meus lençóis e veio deitando com as perninhas geladas no meio das minhas, peludas. De olhos fechados, senti uma língua se aproximando do meu ouvido e já me preparava, duro, para o desfecho usual das nossas noites.
- Eu sei quando você começou a me amar. Você começou a me amar quando esqueceu uma camisinha cheia de porra debaixo da cama e eu fingi que não vi. Começou a me amar quando eu ignorei as ligações femininas que chegavam pra você de madrugada, implorando pelo teu cacete. Me amou também quando eu tive gripe, claro, e quando gritou comigo, e quando escreveu que me amava no espelho do meu banheiro, e quando cozinhou para mim aquelas coisas de nome impronunciável, e quando gastou 50 minutos me amarrando, e quando trocou de cuecas porque eu disse que as que você andava usando eram feias, e quando me mandou calar a boca, e quando me chamou para morar com você, e quando entendeu o motivo de eu não aceitar, e quando disse que eu era a mulher da sua vida. Não há problemas. Já conversamos sobre isso e eu te perdoo por me amar nesses momentos insanos assim como tenho te perdoado tanto e com tanta sinceridade desde o seu primeiro deslize. Mas eu ainda não comecei a te amar. Eu pensava que te amava, mas notei que o amor que vem de mim pra você nunca teve começo. Eu nunca te traí, eu nunca nem levantei a voz pra você a não ser pra pedir tapas mais fortes e pra agradecê-los, mais tarde. Eu nunca puxei meus cabelos por você não atender o telefone e nunca quis te matar, nem te botar pra dormir no sofá, ao ver seus olhos fitando outras bundas. Eu sempre estive pouco me fodendo pra você. Você não entende nada sobre mim, você me trata como se fosse óbvio que eu vou te amar pra sempre e que vou respeitar todos os seus surtos e suas bebedeiras. E eu te digo que eu não vou. O primeiro tapa na cara que você me der enquanto não estivermos trepando e eu te mato, enfio uma faca bem no meio dessa sua barriga branca. Eu não sou boa, não. Essa voz meio trêmula que eu tenho é só disfarce. Os olhos doces também. Os pedidos de desculpa também. Todos falsos, eu nunca cheguei a achar que precisava ser perdoada.
E se esfregava, rebolava com aquela calcinha branca de algodão em cima do meu pau que insistia em continuar ereto. Eu estava com medo. Nunca a havia visto tão furiosa e sua voz nunca havia sido tão firme. Na verdade, ela sempre fora magra, branca, tímida e sem forças, mas agora estava semi-nua, empinando a bunda na minha direção, se esfregando em mim e ameaçando me matar.
- Não sei porque eu estou aqui, se não te amo. Mas é que você tem essa coisa, sabe? Você tem aquele cheiro todo natural de homem bom, tem uma pele quente e amarelada que não deixa o meu nariz se afastar, tem esse hálito sempre impecável e nunca com gosto de pasta de dente ao qual eu dificilmente conseguiria resistir. Tem essa língua sua. Essa língua tão destra e tão rápida, que sempre sabe a medida certa e conhece todos os meus cantos, meus escuros e os meus gostos mais secretos. Não resisto, também. Não resisto aos gemidos que você arranca de mim e a esse teu pau que tá durinho bem agora enquanto eu te ameaço de morte. Voce é louco, nêgo, de se manter perto enquanto eu falo meus absurdos. E se um dia eu te matar, hã? E se me cansar das suas masculinidades todas e pendurar seus gatos nos fios lá da rua? Se esmagar suas bolas, botar fogo na sua casa, matar sua mãe e picotar seus filmes com uma tesoura bem afiada?
Eu queria responder. Eu queria falar um monte de coisas bonitas e dizer que eu ia esperar o amor dela por mim aparecer, mesmo que demorasse um milhão de anos. Queria falar que eu sabia que ela nunca faria nada contra os meus gatos porque ela gostava mais deles que de mim, e que minha língua estaria sempre rapidinha e quente pra quando ela quisesse e que eu me comportaria, juro, que mulher nenhuma se aproximaria de mim, se fosse esse o preço pra tê-la pra sempre. Que tudo bem se ela destruísse meus filmes, que eles nunca chegariam nem perto de ter a importância que ela tinha. Que se a casa pegar fogo, fazer o quê. Vamos dormir em outra, vamos pagar aluguel, vamos trabalhar mais horas por semana, vamos tolerar qualquer coisa em nome do amor. Eu falaria qualquer mentira pra arrancar logo aquela calcinha de algodão já cheia de bolinhas, aquelas de tecido meio velho. Mas ela me cortava. Mansa mansa, agora.
- Eu deveria estar vestida. Eu deveria estar toda vestida para me levantar da cama, pegar meu carro e ir embora daqui. Te deixar sozinho, pra você aprender. Eu não preciso ser amada assim, não, eu quero jogar essa merda que você me dá e diz que é amor num buraco bem fundo cheio de jacarés lá em baixo. Depois de você, eu não quero mais homens. São todos uns imbecis brutos que vomitam todas as frustrações em cima da gente e depois querem sempre um buraquinho quente para usar antes de dormir. Você é como eles, não é? Agora mesmo tá fingindo que me escuta e tá só pensando em quando essa falação toda vai acabar, em quando eu vou abrir as pernas pra fazermos as pazes, em quando eu vou dormir... Você tem sorte em ter esse pau obediente, aí. Estou nervosa, nem sei o que está me dando. Os filmes que você me mostra, também. Tudo tão bom. As coisas que vêm de você geralmente são muito boas, você sabe. Mas seus óculos não me enganam. Nem a barba, nem os tênis sujos. Você é como eles, quer levar minha vida embora e depois me deixar aqui toda seca e implorando pra você voltar. Vai, diz alguma coisa.
- Sua calcinha é linda.
- Sério?
- Aham.
- Mas tá tão velhinha...
- Eu gosto. É pequenininha, apertadinha. Já viu como sua bunda fica linda nela?
- Fica?
- Fica.
Mina Vieira.
Era Ana minha insônia.
Você já dormiu numa casa cheia de goteiras? Horrível. Você se assusta quando as gotas caem e é impossível conviver com aquela música infernal, mas não com Ana. Dormi com Ana dentro de uma barraca azul, inteligentemente armada sob um teto cheio de goteiras. Em poucos minutos, as extremidades dos lençóis estavam molhadas, a vida estava fria e os mamilos clarinhos de Ana estavam duros tentando rasgar minha camiseta cinza que ela havia vestido para tentar aplacar o frio. Eu costumava usar aquela camiseta como lenço durante os meus resfriados; ela era macia e menos agressiva que papel higiênico, mas ela sabia e parecia não se importar.
A desagradável sinfonia das gotas parecia embalá-la e eu podia notar, pela sua respiração, que o sono era pesado. Aqueles malditos e tão lindos mamilos, porém, estavam bem acordados. Rolei no colchão inflável quase vazio e tentei apagar aquela imagem tão excitante da minha mente diabólica. Não funcionava. O cheiro de Ana invadia minhas narinas e meu pau respondia imediatamente, infalível. Minha cueca levantava, minhas mãos não me obedeciam e enfim me aproximei daquele corpo quente e todo arrepiado.
Eu a amava. Não queria acordá-la, tão linda com aqueles cabelos escuros meio caindo na boca e meio se embaraçando no travesseiro. Deliciosa. Dei uma puxada no cobertor só pra relembrar a cor da sua calcinha, tão delicado quanto pude – eu a amava, lembrem-se, mais do que amava meu próprio pau – e a calcinha era branca, como quase sempre era. Branca, com finas tirinhas laterais e alguma renda que eu não conseguia enxergar direito. Ana tinha as pernas finas; afinal, é isto que se espera das mulheres muito magras. Tinha aquelas coxas finas e branquinhas cobertas de uma leve penugem que eu adorava acariciar durante os nossos domingos tediosos. E um puta de um quadril enorme! Pernas finas seguidas de um quadril largo e, logo em seguida, uma bunda firme, redonda, que escapava pelos lados e conferia à minha Ana uma silhueta apaixonante.
Seus mamilos não sossegavam e enquanto eu a olhava e acariciava meu pau, ela me presenteou com um daqueles seus gemidos de sono profundo, daqueles que ela sempre geme quando o sono tá muito bom. Depois mexeu as mãozinhas magrelas e alojou uma delas entre suas pernas que eu imaginava muito quentes. Se as pernas estavam quentes, pensemos naquela buceta, meu Deus, aquela coisa pegando fogo e pronta pra derreter meu pau... droga. Ana adora dormir como adora poucas coisas no mundo, acordá-la seria de uma maldade sem tamanho e ela demoraria muitas horas pra me perdoar. Dane-se, ela me amava também e saberia me perdoar caso a acordasse.
Mas então a sacana decidiu mudar de lado, bem quando eu havia criado coragem pra tirar sua calcinha pequena que não comportava direito toda a grandiosidade do seu quadril. Ficou de costas. E como eu, humano idiota dotado apenas de línguas humanas igualmente idiotas, seria capaz de descrever aquela imagem? Era meu ângulo favorito, definitivamente. Quando nos conhecemos, me apaixonei primeiro por sua bunda e depois aprendi a amar o resto. Sou um homem de bundas, acho que sou assim com todas as minhas mulheres. Olhava já babando pra aquela bunda branquinha e meu pau doía.
Meu amor por Ana era maior que tudo isso e eu era capaz de sobreviver sem incomodá-la. Então, enfiei a mão direita dentro da cueca enquanto repousei muito suavemente a outra sobre aquela bunda fenomenal. Minha mão subia e descia e eu não fechava os olhos em momento algum, vidrado no copo da minha doce Ana, agora meio vadia. Estava respirando alto e o silêncio da casa era tanto – interrompido apenas pelas goteiras – que meu pau parecia fazer um barulho desgraçado. Ela gostava desses barulhos estranhos quando estava acordada, mas agora estava na terra tranquila dos que sabem dormir. Gozei em poucos minutos e me arrependi imediatamente depois. Puta sujeira, meus dedos iam começar a grudar a qualquer momento e estava frio lá fora. Sentei-me e comecei a procurar papel higiênico na barraca, quem sabe, alguma roupa meio suja, qualquer coisa.
Aí Ana se sentou também. Ainda meio de olhos fechados, cabelos totalmente alucinados, mamilos mais lindos que nunca. Sorriu com preguiça, olhou minha mão toda suja e abriu um sorriso maior ainda. Lambeu tudo, dedo por dedo, chupou todos eles olhando nos meus olhos como se estivesse chupando meu pau, não deixou sobrar uma gota sequer. Depois tirou a camiseta, voltou a deitar e disse:
- Vê se dorme, boy.
Mina Vieira.
Testamento.
Mina Vieira.
Particular.
Estava muito calor no dia em que conheci Tânia. Eu odiava o calor assim como odiava o fato de ter que acordar todos os dias às 5h45 da manhã, pisar no cinzeiro cheio que sempre ficava ao lado da cama e olhar pra minha cara abatida com aquelas duas olheiras bem roxas que me acompanhavam desde a adolescência. Odiava fumar. Lembro que comecei com essa merda depois de perceber que todos os namorados da Audrey Hepburn fumavam... eu com os meus quinze anos ficava escondido no banheiro e fumava para que ela talvez se materializasse na minha frente com aqueles lindos óculos escuros e meias pretas cantando com aquele biquinho inconfundível e me chamando com aquele dedinho pequeno naquela mãozinha deliciosa. Nunca aconteceu. Mais tarde deixei de roubar os cigarros da gaveta do meu pai e passei a fumar os meus próprios enquanto fingia que trabalhava ou assistia o canal de compras na TV. Agora tenho dentes amarelos e perco o sono durante a noite com medo de não ter o que fumar de manhã.
Minha saúde toda andava uma merda, na verdade. Eu nunca me exercitava, perdia o fôlego até batendo punheta, tinha preguiça de tomar banho e meu telefone não tocava. Tânia veio quando meu computador de 1995 resolveu não ligar, desgraçado. Eu estava afundado no sofá num domingo à noite esperando o sono enquanto assistia um documentário interessantíssimo sobre auroras boreais. Aquilo, de alguma forma, me acendeu. Queria ir pro pólo norte assistir aquela coisa acontecendo, mas acabei me contentando em correr pela casa para beber minha dose diária de uísque antes que as idéias fossem todas embora. Durante o dia eu trabalhava nos correios e à noite eu escrevia. As auroras boreais me fizeram aprender a escrever. Nesta noite eu fui capaz de criar animalescamente, meio trepando com o teclado. Foi delicioso, a melhor transa da minha vida pré-Tânia. Depois fiquei exausto e fui me deitar. Consegui me masturbar sem perder a respiração completamente e eu era o homem mais feliz do mundo. Tive meu primeiro orgasmo que não exigiu um cigarro e no dia seguinte meu fiel computador de 1995 resolveu não ligar. Poucas horas depois ela apareceu, mas por enquanto eu era de novo um merda viciado com um emprego ruim e um apartamento cheio de garrafas de vodca vazias.
Fui tomar café da manhã na padaria, já que a quantidade de louça que habitava minha pia tornava impossível qualquer manobra culinária. Eu mal conseguia ver meu microondas no meio de toda aquela sujeira e minha geladeira só servia mesmo pra abrigar minhas cervejas queridas. Três andares cheios de delícias belgas, tchecas, inglesas, holandesas e alemãs que me fizeram ir matar a fome na rua. Eu andava sob aquele sol filho da puta pensando que talvez estivesse na hora de comprar alguma comida, contratar alguém pra limpar aquela bagunça e finalmente usar o cômodo das garrafas vazias pra alguma coisa mais útil como uma biblioteca ou um escritório. Mas meu único par de meias sociais fazia meus pés suarem dentro dos sapatos de couro sintético e interrompia qualquer pensamento longo demais. Eu precisava cortar o cabelo e meu computador havia morrido com todos os meus textos dentro dele. Eles estavam prontos pra entrar em decomposição e eu nunca mais os veria.
Mil cabos de aço puxaram meu pescoço pra esquerda. Tânia estava atravessando a rua e parecia vir na minha direção. Minha Audrey. Aquele rostinho bem pequeno e bem meigo, aquele vestido rosa sem decote, aqueles passinhos tímidos e aqueles olhos enormes que me engoliam e entendiam o inferno que havia sido a minha vida até então. Esqueci do misto quente que eu queria comer e só pensava naquelas duas mãozinhas magras segurando meu pau e naqueles olhos perturbadores me olhando de baixo e implorando pra eu gozar. Queria andar até ela e pedir pra ser curado imediatamente, levá-la para morar comigo, queria comprar aquela padaria toda e dar de presente a ela dentro de um embrulho lilás, queria que ela me fizesse parar de fumar. Ela veio dando passinhos que pareciam não prestar pra nada e tenho certeza que demorou uma eternidade pra chegar. Tânia tinha que ser a minha salvação. Ela tinha que ser professora de ioga ou pilates ou educação física, tinha que fazer chás pra mim, me desintoxicar, tinha que me obrigar a acordar mais cedo pra respirar o ar limpo e fresco que Deus reserva pros que acordam muito cedo.
Ela era toda pequenininha. Eu ria das calcinhas minúsculas que encontrava penduradas na torneira do chuveiro, ria dos seus sapatos 34 e ria quando ela usava as duas mãos para me masturbar. Mas Tânia não me curou. Na verdade, ela sempre preparava uma dose de uísque pra tomar no banho e sempre bebia goles de alguma coisa enquanto trepávamos. Parava o sexo na metade pra aumentar o volume das músicas barulhentas que ouvia e voltava pra cama pretendendo continuar exatamente de onde havia parado. Era fascinante e não gostava de cigarros. Tinha uma série de amigos gays que viviam entrando e saindo da minha casa, vendo minhas cuecas no varal e lavando o pau na pia do meu banheiro. Sujava minha cama de maconha e deixava o esmalte nas unhas até que saísse sozinho. Não lavava minha louça. Nem a dela, na verdade. Ela falava de outros homens enquanto estava dormindo e quando bebia demais achava que entendia de política. Tinha espinhas na bunda quando estava de TPM e me fazia sair pra comprar absorventes no meio da noite. Uma desgraça. Eu daria meus três andares de cerveja praquela mulher que não era nem de longe o que deveria ser.
Mina Vieira.
Vou deixar a mala.
Mina Vieira.
Estupro.
E Deus inventou o estupro. Desde então nós, mulheres, fomos ensinadas a ser cuidadosas sobre muitos assuntos. Temos que ser cuidadosas sobre o que vestimos e como vestimos, sobre as cores que gostamos, sobre como nos comportamos, sobre os lugares pelos quais andandamos, sobre quando andamos nesses lugares, sobre as pessoas com as quais andamos, sobre em quem confiamos, sobre o que fazemos, sobre onde fazemos, sobre com quem fazemos, sobre em que posição fazemos, sobre o quanto gememos, sobre o que bebemos, sobre quanto bebemos, sobre qual cigarro fumamos, sobre quantos cigarros fumamos, sobre onde compramos nossos cigarros, sobre as drogas que usamos, sobre o relacionamento que mantemos com os traficantes, sobre se trocamos olhares quando saímos, se estamos sozinhas, se saímos durante a semana, se só temos amigas mulheres, se estamos com estranhos, se queremos sexo casual, se estamos em grupo, se estamos num grupo de estranhos, se está escuro, se aquela é uma área afastada, se temos coisas caras na bolsa, se nossa bolsa é cara, se temos bateria o suficiente no celular, se nosso celular é caro. Temos que nos preocupar sobre o tipo de jóias que usamos, sobre que horas são, sobre que rua é, sobre qual é o ambiente, sobre com quantas pessoas você dorme, com qual tipo de pessoa você dorme, quem são seus amigos, para quem você dá o seu número de telefone, quem está por perto quando o entregador de pizza chega. Temos que nos preocupar sobre conseguir um apartamento onde você pode ver quem está na porta antes que te vejam, sobre checar antes de abrir a porta ao cara da pizza, sobre ter um cachorro bravo, sobre tratar bem todos os seus vizinhos, sobre deixar telefones para contato quando for viajar, sobre ter um colega de quarto, sobre fazer aulas de defesa pessoal, sobre sempre estar alerta, sempre prestar atenção, sempre olhar para os lados e nunca relaxar por um momento sequer. Caso você seja estuprada e não tenha seguido todas as regras acima, a culpa é sua.
Mina Vieira.
Metrópole.
Minha cabeça dói. Aos poucos vou tentando abrir os olhos e me lembrar do que aconteceu ontem. Continuo parada, tenho medo de foder ainda mais a minha dor de cabeça se tentar me mexer. Porra, não lembro o que eu fiz ontem. Nunca esqueço das coisas... devo ter tomado alguma coisa muito doida. Finalmente abro os olhos e começo a tentar descobrir se é dia ou noite, se eu tenho que trabalhar ou se é domingo. A claridade que vem do teto me incomoda, meu hálito também. Tem um cheiro tão ruim saindo da minha boca que parece que vai durar pra sempre. Mau hálito eterno. Meus lençóis fedem tanto quanto a minha boca, talvez mais. Alguma coisa nojenta deve ter acontecido nessa cama. Apesar do nojo, desisto de tentar levantar. Afinal, seja dia ou noite, é tudo sempre uma merda. Estou sozinha nessa casa e nessa cidade que eu não entendo, andando por ruas que me confundem, comendo comida de procedência desconhecida, explodindo de dor de cabeça enquanto alguma coisa interessante tem que estar acontecendo no mundo lá fora. Minha casa está uma bagunça, sempre está. Mas me sinto feliz por pelo menos estar aqui. Sei que na cozinha tem a bebida que eu quiser. Porque não importa o quanto o meu salário seja curto, o dinheiro das bebidas precisa ser respeitado. Afinal, são elas que me fazem esquecer que meu salário é curto. Tem cerveja na geladeira, tem umas garrafas de uísque pela metade espalhadas pela sala, tem uns vinhos guardados, tem pinga também. Nem a ideia de um novo porre parece me curar. E eu nem sei porque tô assim. Talvez eu precise do que me deixou desmemoriada, da droga mágica que me fez esquecer tudo. Não sei onde conseguir drogas nessa cidade estranha. Não tenho o telefone de ninguém que saiba e não tenho carro pra sair andando por aí até encontrar. Mesmo que tivesse, não teria grana. Posso trocar um mês de comida por uns gramas de cocaína, mas nunca fui de pó. Podia sair procurando alguém pra trepar comigo. Lá onde eu morava tinha um cara que sempre me ajudava. Curava minhas tristezas, minhas crises, minhas ressacas, minhas dores de cabeça, minha eterna falta de dinheiro, meus problemas no trabalho, minhas frustrações mais imbecis e até mesmo esses meus surtos degradantes. Com um orgasmo só. Às vezes dois ou três, só por esporte, mas unzinho era capaz de mandar tudo embora. Mesmo que eu voltasse pra lá, ele não me curaria. Parece que vai casar, não sei. Engravidou uma menina aí e agora vai ter que ser rapaz direito. Só me resta rir. Queria uma prostituta qualquer, sei lá, mas não sei como essas coisas funcionam e também tô sem um puto na carteira. Vai ver entrei nessa loucura toda de agora porque ontem consegui alguém, finalmente. É muito difícil conseguir pessoas aqui e eu aposto que fiz merda, eu sempre faço. Olho no relógio e os números me fazem lembrar que meu ônibus vai passar em menos de 30 minutos e eu preciso trabalhar. Não lembro onde trabalho, caralho. Melhor ficar em casa e esperar até que as coisas voltem ao normal. Talvez eu ligue pra minha mãe.
Mina Vieira.
Denise.
Eu tinha acabado de sair de um show no dia em que conheci Denise. Eu estava meio bêbada e precisava pegar o ônibus pra voltar pra casa. Sentada na calçada, eu me esforçava pra manter os olhos abertos e conseguir ler os nomes das linhas. Nem sempre funcionava. Maquiagem toda borrada, cabelos sujos e emaranhados, pés metidos na sarjeta cheia d'água e já esperando a dor de cabeça e os possíveis vômitos do dia seguinte. Denise apareceu quando voltei de um dos meus cochilos. Vinha lá do final da rua, estava tudo escuro, acho que só a vi quando estava já bem perto. Não tinha cara de quem precisava pegar ônibus. Parecia que tinha descido do seu carro e andado até mim só pra se vingar de algum amor mal acertado, só pra me bater até que sua raiva passasse e ninguém nunca ficaria sabendo. Eu morreria ali mesmo com um monte de sangue seco grudado na cara e Denise voltaria a ser feliz. Devia ter uns 7 ou 8 anos a mais que eu, mas mesmo assim sentou na calçada do meu lado e começou a puxar papo. Minha língua de bêbado não se movimentava da forma como eu gostaria, o álcool a tinha adormecido e eu me sentia falando muito devagar, uma idiota. Sentia que babava demais, não conseguia usar frases muito longas e sempre tinha que voltar pra corrigir as palavras. Denise, muito paciente, insistia. Perguntou meu nome, o que eu fazia, de onde eu vinha, do que gostava... esses papos bestas. Eu já tinha desistido de agir normalmente depois de umas 4 perguntas. Só olhava fixamente aqueles peitos gigantes apertados dentro de um vestido azul clarinho. Eu sempre costumava dizer que só era fascinada por peitões porque tinha peitinhos. Mentira. Era fascinada por eles porque são lindos e gostosos e ficam deliciosos apertados em vestidinhos minúsculos. Ela estava sentada de pernas abertas, a rua toda podia ver sua calcinha. Eu não me importava com isso, mal sentia vontade de ver sua calcinha. Babava hipotizada por um maldito par de peitos. Acho que ela percebeu, qualquer um perceberia. Depois disso, eu decidi ser sincera com ela. Estava doida para experimentar uma mulher já fazia tempo, estava bêbada, não a conhecia, ela também parecia querer, ninguém passava na rua. Então eu disse pra ela, eu disse que naquele momento a única coisa que me parecia sensata era chupar seus peitos. Provavelmente, era a única coisa que meu estado de embriaguez me permitiria fazer. Ela riu, não me levou a sério. Eu disse que só isso me ajudaria a ficar um pouquinho sóbria pra voltar pra casa em segurança. Ela pirou, acho que queria mesmo me ver sóbria. De repente assumiu uma postura estranha de mãe e quis me ajudar. Mexeu um pouco nos meus cabelos e puxou minha cabeça com força, me deu um beijo ruim. Eu não sabia que mulheres podiam ser capazes de beijar assim, tão rudes. Então eu decidi retribuir a violência e agarrei seu seio esquerdo com força, espremendo aquela carne molenga entre os dedos, meio querendo que estourasse. Ela também não deve ter gostado. Foda-se, eu mal me lembrava que ela estava ali. Abaixei a alça daquele vestido que certamente era menor que o tamanho dela e devo ter perdido alguns bons minutos com a boca naquilo, fazendo tudo errado. Denise queria deitar na calçada cheia de insetos e peças de lixo que eu não conseguia identificar. Eu tinha nojo e não queria mais nada dela além dos peitos. No máximo, talvez, juntar os meus humildes com toda a pretensão dos dela, mas não mais que isso. Meu ônibus passou, eu dei um gritinho, já estava doida pra fugir. Ela disse que me deixava em casa, não tinha problema, o carro dela estava estacionado a poucos quarteirões dali. Eu sabia que ela tinha me escolhido, sabia que era de propósito. Recusei e fui embora a pé, cambaleando. Às vezes eu me arrependo de não ter conhecido melhor aquele corpo, de não ter lambido e violado todos aqueles orifícios tão ricos ali mesmo no meio da rua. Sempre que fico tonta de álcool penso em Denise. Ela me curou. Não peguei em outros peitos além dos dela e dos meus, tenho vontade sempre. Às vezes sonho que contrato prostitutas lindíssimas e de peitos tão grandes quanto os dela, acordo molhada. Às vezes ligo pras minhas amigas que ainda não saíram da adolescência e estão dispostas a fazer qualquer loucuragem. Nunca acontece.
Mina Vieira.
Motivo.
Mina Vieira.
Esclarecimento.
Todos os textos postados até agora foram escritos entre 2007 e 2010 e já haviam sido postados previamente num outro blog que eu tinha, com exceção de Eu costumo empregar a palavra 'fabuloso', Das coisas que a gente nunca diz, A louca e Quero. Todos os textos, a partir de agora, serão inéditos.
Para elogios/críticas, avisos sobre erros que escaparam da revisão, sugestões e blá blá blá, divirtam-se nos comentários ou em mina.vieira@hotmail.com.
Eu costumo empregar a palavra 'fabuloso'.
Mina Vieira.
T., que mais tarde revelou se chamar Tatiane.
T. tinha as orelhas geladas a qualquer hora do dia e em qualquer dia do mês para todos os dedos aflitos que as quisessem tocar. Tinha cheiros de maracujá e de outras dessas frutas que não costumamos comer todos os dias espalhados pelo seu corpo, debaixo de suas saias, entre seus dedos, dentro de seus olhos, na ponta de sua língua. T. tinha mãos de fada de dedos longos e unhas quadradas sempre limpas e talvez pintadas com cores diurnas e felizes. Tinha borboletas na garganta para libertá-las junto com o surpreendente tom de sua voz e folhas de hortelã presas entre os dentes esperando para entrar em ação quando ela decidisse falar. T. movia as pernas de forma estranha: uma de cada vez, com o ritmo marcado pelo balanço brutal de seus quadris que derrubavam um exército com cada um de seus movimentos.
T. tanto matou de amores que um dia acabou morrendo.
T. morreu de tanto fazer amar.
Mina Vieira.
Com afeto.
Ele tem esse jeito de me fazer saber que, mesmo não sendo total culpa dele, vai ser igual. Ele vai me surpreender com todos os seus ares e vai me fazer acreditar, talvez sem querer, que dessa vez vai dar certo. Mas então vai ser impossível e nos conteremos no começo para parecermos adultos sensatos, mas em poucos meses fracassaremos e faremos promessas que eu, pelo menos, saberei sempre que não vou conseguir cumprir e saberei disso desde o começo, desde o nascimento dessas promessas.
Não será culpa dele, mas por algum tempo eu vou pensar que toda a frieza e distância e o jeito de homem que não liga é tudo o que eu quero para a vida e vou me sentir feliz enquanto achar que vai ser para sempre. E então que as pessoas mudam e ele não é de ferro, por mais que pareça ser, e vai mudar também, vai deixar de se aproximar da perfeição para começar a me irritar com todas as suas tentativas de agrado.
Eu sei, eu sempre sei que é assim e que minha insatisfação não tem nada a ver nem com ele e nem com qualquer outra pessoa além de mim, mas me cabe às vezes acreditar, por alguns poucos minutos, numa chance. Eu posso ferver por alguns meses e me permitir uma leve empolgação. Tudo bem trocar algumas palavras e deixá-lo perceber que eu quero/quis e penso nele, claro, mas agora não. Agora temos outros planos, eu e ele, e eu não acredito mais nessas coisas de amar bonito e para sempre.
Mina Vieira.
Nós, continuando a ser mulheres.
Eu acho que valho menos que uma mulher bonita qualquer que você encontra na padaria de manhã. Eu acho que eu sou menos importante que qualquer um dos seus outros problemas, apesar de inevitavelmente ser o maior deles. Eu acho que você se importa tão pouco a ponto de só lembrar de mim bem tarde, quando estiver saindo do trabalho e quando suas costas estiverem doendo tanto que você precise ligar pra alguém pra dizer caralho, tá doendo demais. Eu acho que não tenho chances de ser algo mais que a sua garota de sexta-feira e acho que não quero ser mais. Eu acho que te causo algum tipo de conforto muito estranho, mas bom a ponto de você não conseguir se livrar disso. Eu acho que nós dois somos putos egoístas numa eterna batalha de tentar provar que somos muito capazes de não nos envolvermos sentimentalmente, obrigada. Eu acho que isso tudo vai terminar mal e eu acho mesmo que você não se importa.
Mina Vieira.