segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Eu queria - parte 1.

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Eu queria ser mais simples, queria ter menos faces, queria ser mais plana e menos profunda. Eu queria ser fácil, queria ser rasa, queria saber lidar com bebês e queria que os gatos se aproximassem de mim sem que eu tivesse que correr atrás deles. Eu queria que meus dedos não doessem enquanto eu digito, eu queria ter sido uma boa escritora nos meus períodos de crise. Eu queria ter tido menos crises. Eu queria ter menos problemas e coisas ruins/fortes pra contar sobre o passado. Eu queria saber me expressar melhor. Às vezes eu queria encontrar um meio, um equilíbrio entre o exagero que eu sou e a brandura que eu queria ser: seria o ideal ou, pelo menos, o suportável. Eu queria uma opinião unânime sobre mim. Eu queria um tratado sobre tudo o que eu sou e sobre as coisas que estão erradas dentro das coisas que eu sou. Eu queria consertar essas coisas. Eu queria ser mais flexível, mais maleável, menos radical, mais agradável, mais verdadeiramente cordial. Eu queria ter mais livros, mais CDs, mais escritores favoritos, mais vozes favoritas, mais paciência, mais normalidade. Eu queria mesmo ser alguém mais equilibrado. Eu queria ser mais constante, mais linear, mais reta, mais previsível. Eu queria não ser perigosa, eu queria que não houvesse um aviso de perigo colado na minha testa, eu queria que as pessoas pudessem se aproximar com a minha garantia de que nada vai acontecer a elas. Eu queria ter entendido antes que beleza - a nossa - é algo que vem de dentro antes de qualquer outra coisa. Eu queria saber aos 11 anos que é sério o que dizem sobre só sermos bonitos depois de alcançarmos certa coisa também bonita dentro de nós. Eu queria saber contar histórias. Eu queria conseguir narrar coisas, inventar nomes para personagens, inventar casos e me manter falando sobre eles por tempo o bastante pra que virem contos ou novelas ou romances inteiros. Eu queria me excitar com poesia, eu queria ter uma voz bonita pra cantar, eu queria falar com mais calma, eu queria ser daquelas pessoas misteriosas que falam pouco e estão sempre com um olhar estranho de quem não está feliz, mesmo quando estão sorrindo. Eu queria saber cantar mais músicas, queria assistir mais shows, queria mais amigos, queria mais e mais o tempo todo. No fundo, eu continuo querendo mais intensidade. Apesar de pedir equilíbrio e brandura, eu ainda quero a unha na carne e sangrar pra escrever o que realmente importa.

Mina Vieira.

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